Afinal o que faz de Toronto uma cidade tão atraente?
Será a arquitetura, um misto de metrópole com quarteirões de torres de dezenas de pisos, de edifícios vitorianos bem integrados na nova cidade e de bairros residenciais tranquilos e que podiam estar em qualquer cidade norte-europeia?
Será a criatividade e inovação vibrantes que se intuem das conversas, pessoas, cultura, montras, publicidade, empresas, universidades, espaços…?
Será por ser a quarta maior cidade da América do Norte e conseguir não ser impessoal apesar da escala?
Serão as pessoas e o ambiente acolhedor e multicultural que – muito além da tolerância – apela verdadeiramente à diversidade?
Muito provavelmente, será tudo isto e várias outras características que não cabem neste texto nem se apreendem em 4 ou 5 dias.
Convidamos-vos a passarem connosco uns minutos – não em Toronto mas nos nossos dias por lá, e no que da lá trazemos. Bora?
Collision: America’s fastest growing tech conference
Quando dizemos que a Collision é a Web Summit do continente americano estamos a ser literais: os modelos são muito semelhantes, a dimensão é que (ainda) não. Esta primeira edição da Collision em Toronto teve 25,711 participantes de 125 países – mas a conferência ficará em Toronto por três anos e o espaço para crescer é enorme.
Tal como a Web Summit, a Collision é já muito mais do que um conjunto de talks e debates. É também um ponto de encontro e networking de quem trabalha nestas áreas, de startups e outras empresas, de quem investe e decide, de quem adquire – e um enorme showcase de muito do melhor que se faz pelo mundo inteiro em termos de inovação tecnológica.
Justin Trudeau, primeiro-ministro canadiano cujo discurso abriu a Collision, reforçou a mensagem que o Canadá é um país onde todas as pessoas e todas as empresas são bem-vindas, sublinhando o papel de imigrantes e da diversidade na estratégia e sucesso da cidade. E orgulhou-se das comunidades mais resilientes, mais criativas e desenvolvidas devido às políticas de imigração, num momento da história mundial em que são muitos os países que escolhem fechar fronteiras ou apertar as políticas de imigração.
Lisboa – e Portugal – estiveram bem representadas neste evento. Ao todo, fomos mais de cinco dezenas de pessoas a partir para a cidade canadiana com diferentes objetivos.
A Made of Lisboa e StartUp Portugal foram hosts do Web Summit in partnership with Lisboa |Portugal Lounge, ponto de encontro incontornável de quem participou na missão portuguesa; foram 13 as startups que tiveram acesso a um balcão para showcase durante todo o evento; e foram várias as instituições, empresas e incubadoras que nestes dias representaram a cidade e o país num dos eventos mais inovadores à escala mundial.
Se valeu a pena? Resultados concretos de parcerias e negócios virão a público (ou não!) com o tempo, mas não temos dúvidas que os contactos feitos nestes dias terão impacto.
Mas além das conferências e networking da Collision, houve tempo para visitas a equipamentos e instituições de excelência e até para a assinatura de um protocolo de colaboração entre Toronto e Lisboa.
MaRS: Innovation is the quest for human progress
Inicialmente, MaRS significava Medical and Related Sciences, sendo a saúde o foco inicial, mas em pouco anos transformou-se num dos maiores hubs urbanos de inovação do mundo e passou a acolher várias outras áreas de investigação e trabalho, até que, hoje, MaRs é “apenas” um nome – um nome que representa uma zona onde a inovação mundial acontece. Muito ligada à Universidade de Toronto, MaRs agrega centros de investigação desta Universidade, start-ups, empresas e investidores. As principais áreas de atividade são quatro: Cleantech; FinTech; Saúde; e Enterprise Software (EAS).
Neste Hub há de tudo – incubação, aceleração, experimentação, investigação, mentoria, financiamento, eventos de vários tipos e dimensões e acesso aos mais diversos programas, projetos e pessoas, numa escala gigantesca: emprega um total de cerca de 13.000 pessoas, em mais de 120 organizações, em quase 40,000 m2.
Construído no local onde a insulina foi descoberta, MaRS foi fundada em 2000 por um grupo da sociedade civil canadiana com o sonho de construir impossíveis. Entre donativos e apoios que angariaram, públicos e privados, conseguiram criar o MaRS.
Uma das visões deste espaço é o equilíbrio e a criatividade que advém do mix de empresas e instituições que acolhe: de startups a empresas lideres mundiais (como a Samsung, Autodesk ou Airbnb).
Fascinada/o? Quem sabe se a tua startup não cria um braço no MaRS ou se há oportunidades à tua medida?
DMZ: Changing entrepreneurs’ lives
O que mais impressiona na DMZ (Digital Media Zone) é o seu alcance: é a maior incubadora do país e concentra grande parte de tech startups em diversas indústrias. Financiada em grande parte pela Ryerson University, está localizada numa das zonas mais icónicas de Toronto, no cruzamento das ruas Yonge & Dundas – uma espécie de Piccadilly Circus ou de Times Square.
A DMZ procura as startups mais promissoras para os seus três principais programas: sandbox, validator e accelerator, conforme a fase em que se encontre a startup. Têm também um programa de soft landing, DMZYYZ, e vários outros programas como o Women Founders ou o FinTech. A propósito: o governo canadiano facilita o acesso a vistos a quem queira iniciar-se no Canadá e tenha sido aceite num destes programas.
Embora trabalhe em diversas áreas, as principais são Fashion Zone, Legal Innovation Zone e Digital Media Zone. Alguns números : desde que foi lançada em 2010, incubou 388 startups que asseguraram mais de $563 million de investimento e fomentou a criação de mais de 3,660 empregos.
As candidaturas abrem três vezes por ano e quem passar a primeira triagem tem que ir a Toronto fazer um pitch. Apenas cerca de 7.4% das candidaturas são selecionadas.
Artscape: finding common ground
Se o Centro de Inovação da Mouraria e o Fablab se juntassem, e duplicassem (triplicassem?) as suas respetivas dimensões, teríamos um resultados na linha do Artscape Daniels Launchpad.
Este hub criativo alberga e dá palco às mais diversas industrias criativas, possibilitando que designers e artistas das mais diversas áreas colaborem, criem e tenham sucesso financeiro através da sua arte. Equipado com as mais recentes tecnologias e ferramentas nos seus laboratórios e espaços, o Artscape inspira quem lá trabalha e potencia as possibilidades criativas – e permite a criação, prototipagem ou produção de coisas nunca antes vistas. O acesso a instalações fantásticas a preços simbólicos (mesmo para padrões portugueses – por exemplo um espaço de cowork para alguém com menos de 25 anos custa menos de 50€/mês) e a um painel enorme de especialistas e a uma comunidade disposta a prestar mentoria à medida faz deste um equipamento de referência numa cidade onde este estatuto é muito disputado.
Fundado e financiado inicialmente por meios privados com apoios públicos, o Artscape conta com aproximadamente 1000 membros, cujas quotas constituem uma das suas formas de sustentabilidade, sendo que tem capacidade de acolher até 2500. Além das quotas, o Artscape financia a sua atividade com aluguer de salas para eventos, de espaços e laboratórios a pessoas externas (e internas) e de equipamentos específicos como o Media Digital Lab, um dos espaços mais requisitados e onde pode ser filmadas, gravadas, fotografadas ou editadas as mais variadas peças multimédia.
University of Toronto: may it grow as a tree through the ages
Fundada em 1827, a Universidade de Toronto é a mais antiga instituição de ensino no Canadá, é pública e é enorme, com o seu campus no centro de Toronto de mais de 70 hectares (há mais dois campus nas redondezas da cidade) e as/os mais de 45.000 alunas/os de 163 países/regiões. Mais números? A Universidade acolhe mais de 800 clubes e plataformas de estudantes, dispõe de 11 residências, contribui anualmente com $15.7 milhões para a economia canadiana, e nos últimos três anos criou cerca de 60 novas empresas de base tecnológica e de inovação – mais do que qualquer outra instituição na América do Norte. Tem um corpo profissional de mais de 21,000 pessoas e um conjunto de alumni que ultrapassa o meio milhão. Impressionante, não?
Além de tudo isto, é consistentemente considerada – nos mais variados rankings e pelos mais diversos indicadores – uma das melhores universidades do mundo. Oferece um sem número de diferentes programas e acesso a instituições de investigação – tantos que é difícil sistematizar num artigo. Felizmente existe a internet.
Memorando de entendimento entre Toronto e Lisboa
Sim, Lisboa e Toronto têm escalas diferentes. Mas têm também muito em comum: são ambas cidades que apostam no empreendedorismo, na criatividade, na inovação e no conhecimento; são cidades onde a diversidade multicultural é um facto e onde as pessoas e instituições a acolhem e algumas até estimulam; são cidades seguras; são destinos referência nos seus países; ambas estão em países que são vizinhos de países maiores – e portas de entradas para mercados apetecíveis; ambas as cidades têm boa fama e reúnem simpatia e boa-vontade, de forma geral; a existência de uma comunidade portuguesa grande em Toronto faz desta cidade especial conhecedora da nossa cultura (há uma Little Portugal em Toronto, e por lá não faltam pastelarias com pasteis de nata ou pratos de bacalhau); e so on and so forth.
Foram estas semelhanças o motor da vontade de colaborar e potenciar as sinergias entre as duas cidades e os seus ecossistemas. Do momento da assinatura do protocolo fica uma foto – dos resultados do mesmo esperamos vir a partilhar projetos muito em breve.
Quayside: reimagining cities to improve quality of life.
QUAYSIDE é um projeto da SideWalk Labs com uma dimensão utópica e potencial de ficção científica: a ideia é utilizar a tecnologia e conhecimentos de hoje para construir, do zero, uma autêntica cidade sustentável, inteligente, equilibrada e com uma comunidade a vivê-la. O desafio é enorme e fascinante: cerca de uma centena de profissionais com as mais diversas formações e experiências idealizam um sonho comum – e investigam para o construir.
Sim, este é o projeto onde qualquer pessoa que se preocupe com o futuro, e com as cidades do e no futuro, gostaria de trabalhar. E vai nascer em Toronto, num espaço junto ao lago Ontario. Nicole LeBlanc, Investments & Partnerships Director, que nos apresentou o QUAYSIDE, deu-nos alguns exemplos dos desafios que enfrentam: planear edifícios com vários andares com a estrutura base de madeira e materiais naturais; escolher o que de melhor se faz no mundo inteiro em termos de boas práticas de gestão inteligente da cidade (do trânsito à gestão de resíduos) e adotar as melhores inovações, desenvolvendo de raiz outras tantas soluções; ou gerar um equilíbrio entre habitantes, atraindo pessoas e famílias de diferentes rendimentos, e possibilitando que as suas casas cresçam caso as necessidades familiares se alterem. Uau.
A Shifter já escreveu sobre isto e vamos recomendar a leitura desse texto, mas antes ainda deixamos aqui alguns caminhos para explorar mais sobre este projeto: o podcast, alguns princípios de acessibilidade, produção e habitação acessível, bem-estar em comunidades urbanas.
Este projeto inspirador não é uma maneira ótima de terminar a viagem a Toronto?